Ouro Preto, há pouco, reviveu em suas ladeiras históricas a Paixão de Cristo.
Agora, revive a figura de Tiradentes e nos coloca novamente diante do inocente condenado, o mártir sem crime, a vítima do absolutismo. Tiradentes foi o Cristo republicano, ao longo do Império brasileiro, consagrado como herói nacional após a Proclamação da República. O suplício na cruz e na forca sensibiliza as gerações. A traição de Judas e de Silvério dos Reis comove e revolta.
Faz 2 mil anos, no templo da fé, e 200 anos, no espaço democrático, que os dois sentenciados comovem nosso espírito. Se a Páscoa é ressurreição de Cristo, o 21 de Abril assinala, especialmente neste ano, o renascimento do Tiradentes na nossa crença republicana.
O Tiradentes histórico não será o líder descaracterizado pelo cinismo com que os antidemocratas costumam tratá-lo, mas, sim, o homem de coragem, íntegro e altivo, que sai do meio do povo para mudar o curso da história. O Brasil o reconhece como pioneiro da liberdade e da democracia, porque com ele podemos saudar a democracia e a liberdade na vida pública do nosso país. O Brasil mudou, felizmente.
Alguns dizem que livre e democrático é o país que consagra o liberalismo econômico. No entanto, quando a doutrina liberal serve de defesa aos interesses que espoliam a riqueza da nação e os direitos do povo, é o Tiradentes que desperta, inspira, encoraja e anima. Ele nos ensina que a exploração despótica e arbitrária, arrogante e cruel, dos recursos minerários do Brasil não pode prevalecer sobre o destino de nossa pátria.
“Ah!, se eu me apanhasse em Minas!” – bradaria outra vez o animoso Alferes, pronto a comandar os mineiros contra a ditadura das mineradoras. O apelo de Ouro Preto, das cidades históricas e municípios minerados – ontem do ouro, hoje do ferro – é no sentido de que o governo de Minas Gerais, em parceria com o Espírito Santo, a União Federal e o Ministério Público, envolvendo as municipalidades vitimadas, promova o mais depressa possível a compensação a que temos pleno direito.
Não é mais possível sustentar a longa e assombrosa espera. É visível o drama. Nossas rodovias estão destruídas, nossos rios poluídos, nossa população empobrecida. Projetos sociais de relevância carecem dos recursos financeiros retidos pelas querelas ou malbaratados pelo desperdício acintoso das instituições.
Faz exatos 200 anos, a Vila Rica dos Inconfidentes foi elevada por Dom Pedro I à dignidade de Imperial Cidade de Ouro Preto. As cidades históricas guardam a alma de Minas Gerais. Nelas andaram os conjurados na pregação da liberdade.
Pelo sua cultura, história e beleza despertam o fascínio, fazem com que o turismo cresça, como em nenhuma outra parte do país, e confira ao nosso Estado mais uma perspectiva segura de desenvolvimento social e econômico. Por isso mesmo, as cidades históricas mineiras precisam de atenção.
Que a memória de Tiradentes e dos Inconfidentes de 1789 seja sempre uma luz a guiar a cidadania das mineiras e dos mineiros, o sentimento de Minas e a liberdade do Brasil.
Angelo Oswaldo é prefeito de Ouro Preto e Presidente da Associação das Cidades Históricas de Minas Gerais